quinta-feira, 25 de outubro de 2012

Antonio Machado: Os jovens com “propensão ao crime” de Serra

publicado em 24 de outubro de 2012 às 12:43

por Antonio Machado

Ao responder uma pergunta sobre violência nas escolas, o candidato do PSDB à Prefeitura de São Paulo, José Serra, afirmou ter uma parceria com a Fundação Casa, a antiga Febem, para identificar jovens que tenham “propensão ao crime” e fazer com eles um “trabalho preventivo” de “monitoramento”.
A declaração, feita à Rádio CBN na última terça-feira, logo repercutiu nas redes sociais, mas foi abafada em seguida pelas críticas ao jogo “Angry Haddad”, lançado pela campanha tucana.

Herr Serra diz que vai identificar nas escolas a criança que tem POTENCIAL para ser bandido ou drogado


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Como até o momento o candidato não detalhou a proposta, vamos nos ater ao que foi dito, literalmente: “Temos um programa feito com a Fundação Casa, a antiga Febem, para atuar nos jovens que estão dentro das escolas, que ainda não entraram para o mundo do crime, mas podem ter propensão para isso. Então nós vamos fazer com eles um trabalho preventivo, que é identificar quem tem um potencial para ir para o crime, para ir para a droga, e fazer um trabalho de monitoramento”.
Em primeiro lugar, não é boa ideia, em nenhuma hipótese, aproximar a antiga Febem das escolas. Serra evidentemente não propôs prender alunos por mau comportamento.
Porém, a Fundação Casa é uma instituição supostamente preparada para atuar em casos de extrema gravidade, inclusive com medidas de internação (privação de liberdade), mediante a determinação judicial.
Mas não é esse o ponto mais grave da declaração. Serra não fala em jovens que tenham cometido atos criminosos, mas que teriam “propensão” ao crime.
Segundo o dicionário Houaiss, propensão significa “capacidade inata para (algo); inclinação, vocação, pendor.” Inato, de acordo com a mesma fonte, é aquilo “que pertence ao ser desde o seu nascimento; inerente, natural, congênito”.
Pela declaração de Serra, podemos entender que o candidato do PSDB acredita que determinados jovens, estudantes de escolas públicas, tenham tendência natural à criminalidade.
Por não estar relacionada às experiências, esse “potencial”, para ele, não poderia ser combatido apenas com medidas educativas – como as que propôs seu adversário Fernando Haddad na mesma ocasião –, mas com “monitoramento”.
Superada a questão da “propensão” criminosa, base de algumas das maiores atrocidades do século XIX, nos cabe imaginar quais seriam os critérios utilizados pelo Estado para identificar esses jovens. Certamente não seriam frenológicos ou genéticos, como a estarrecedora declaração nos faz imaginar.
Porém, qualquer critério que se proponha a identificar criminosos em potencial é necessariamente preconceituoso e autoritário. Dentro da escola, essa intenção assume uma proporção absurdamente perversa.
Não é o caso de entrar na discussão sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente ou das práticas da Fundação Casa. O que espero sinceramente é que esse tipo de proposta não esteja realmente no programa de governo do candidato tucano – se é que esse programa existe –, e que Serra volte atrás, reconhecendo que disse uma das maiores bobagens de toda a campanha. Depois, espero que esse tipo de “solução” seja cada vez mais rejeitada pela sociedade, e que os próximos debates eleitorais se deem em mais alto nível.
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Debate SBT/Uol: Haddad X Serra

 



No debate Haddad x José Serra no SBT/Uol, ficou claro pelas perguntas que José Serra escolheu fazer, que ele jogou a toalha e desistiu de vencer estas eleições. Perguntou e respondeu procurando apenas melhorar sua imagem, já com vistas em 2014.

Antes de mais nada, Haddad venceu o debate por ser mais consistente e assertivo. Serra perdeu porque fugiu das perguntas várias vezes. Porém, ninguém chegou a cometer algum erro fatal capaz de mudar intenções de votos, e é improvável que o debate mude o quadro das pesquisas que dão vitória para Haddad com uma diferença de 13 a 15 pontos, dependendo do instituto.

Nas vezes em que Haddad teve oportunidade de escolher a pergunta, os temas foram de peso, ora sintonizados com as maiores preocupações dos paulistanos, ora pegando os pontos fracos que Serra procura fugir:

- Responsabilidade de Serra como ex-governador na escalada da violência;
- Taxa de inspeção veicular e pedágios nas rodovias dentro da área urbana;
- Enchentes
- Moradia

Quando José Serra pode escolher a pergunta, ele procurou temas mais amenos, que, embora importantes, estão abaixo na lista de preocupações que os paulistanos consideram serem as mais urgentes entre todas. Serra perguntou sobre:

- parques da cidade (relacionados ao meio-ambiente);
- políticas culturais (Serra escorregou ao pedir para Haddad não citar a "questão social" na resposta, pois apenas reafirmou a imagem tucana de não ter sensibilidade social);
- perguntou sobre políticas para pessoas com necessidades especiais (portadores de deficiência);
- ciclovias;

Como se vê, José Serra fugiu de um debate mais duro, que seria uma tentativa final de ir para o tudo ou nada. O tudo seria uma improvável virada, e o nada seria o risco de ter menos votos do que no primeiro turno, por exemplo.

Ao escolher temas amenos, Serra jogou a toalha nestas eleições, e desistiu de tentar vencer. Quer apenas sair com a imagem um pouco mais positiva do que tem agora, procurando temas mais simpáticos e menos pesados.

Serra aposta que terá um recall alto nas pesquisas presidenciais durante o ano de 2013 e início de 2014, mantendo-se na frente de Aécio como o principal nome da oposição, o nome mais lembrado pelo eleitor nas pesquisas.

Aécio pode desistir de concorrer à presidência em 2014 se achar que não tem chances de vencer Dilma e, ao mesmo tempo, sentir um risco alto de perder o governo de Minas para o PT ou PMDB. Ou pode desistir se for abatido por fatos novos do "mensalão" tucano, da lista de furnas, da rádio Arco-Iris, ou de algum outro escândalo entre as dezenas que os tucanos mineiros varrem para debaixo do tapete. Pode até ser abatido por um simples bafômetro, dado seus hábitos. Neste caso, se a oposição não tiver candidato nenhum, pode aceitar Serra como uma espécie de anti-candidato (para alegria geral da blogosfera em 2014). Provavelmente, pelo comportamento de Serra no debate, ele já está se preparando para esse cenário.

Voltando ao debate SBT/Uol, quando os temas foram determinados pelos internautas, por sorteio, e os candidatos não puderam escolher o assunto, coube a Haddad perguntar sobre:

- combate a corrupção;
- trânsito (engarrafamentos e transporte público lotado);

Coube a Serra perguntar sobre:

- saúde (os internautas reclamam da demora nos exames e consultas);
- Crack e cracolândia;

Nas respostas, houve troca de farpas de todos os lados. Haddad encaixou bons argumentos, cobrando falhas da gestão Kassab e do próprio Serra, falta de comprometimento de Serra com novas propostas, a intervenção desastrada na cracolândia, a proposta de vender 25% dos leitos dos hospitais públicos para a iniciativa privada.

Serra também distribuiu farpas, mas à medida em que o debate se encaminhava para o fim, procurou atacar menos, e tentar ser mais propositivo, fugindo das perguntas, para falar do que queria, como promessas de bolsa no ensino técnico, e de um factóide lançado de última hora: um "upgrade" no bilhete único. Certamente porque perdeu o debate do bilhete único mensal, ao qual parou de fazer críticas.